domingo, 30 de março de 2008

Marxismo criativo

Demetris Christofias: "Praticamos um marxismo criativo"

Demetris Christofias foi eleito presidente de Chipre no mês passado, com a promessa de resolver o conflito entre cipriotas gregos e turcos e parar com a divisão da ilha. O que é que lhe dá tanta certeza de trazer a paz à ilha do Mediterrâneo? Como será a polítca do unico presidente comunista da União Europeia? É o que quisemos saber nesta entrevista exclusiva, a primeira de Christofias desde que foi eleito presidente. Steve Jones, EuroNews: Demetris Christofias, bem-vindo à EuroNews. O que é que convenceu a maioria dos eleitores de Chipre a votar em si? Demetris Christofias, Presidente de Chipre: Devo a minha eleição à enorme e longa luta na qual o meu movimento político e eu próprio estamos empenhados. O objectivo foi sempre a salvação de Chipre, a sua independência e a concretização dessa independência, através do fim das intervenções estrangeiras em Chipre. A empatia do nosso movimento com a vida das pessoas do povo foi um factor importante na minha eleição. Mas mais importante ainda foi a persuasão feita graças à nossa atitude sobre a solução do problema cipriota, pelo fim da ocupação e pela coabitação pacífica entre cipriotas gregos e turcos, no contexto de uma federação com duas zonas, duas comunidades. EN: O senhor fez campanha, prometendo tentar reunificar Chipre. O que tem a mais que os outros, que tentaram também resolver esta questão, ao longo dos últimos 34 anos? DC: Como já disse, tenho uma longa experiência de luta por uma coabitação pacífica entre cipriotas gregos e turcos. Mesmo se as pessoas no nosso país rejeitam vigorosamente a ocupação e a intervenção estrangeiras, frisámos sempre que os cipriotas turcos não são nossos inimigos e que, no contexto social, são nossos irmãos. EN: O seu predecessor, Tassos Pappadopoulos era visto como partidário de uma linha dura. Já o senhor é visto como um pragmático, um conciliador. Mas como é que vai conseguir convencer os cipriotas de que não vai dar demasiado terreno ao outro lado? DC: Não está correcto considerar Papadopoulos como um partidário da linha dura. Para mim, o facto de o povo ter votado em mim significa que estão convencidos de que me conformei aos princípios gerais, segundo os quais é preciso construír uma solução. Esses princípios são as soluções apropriadas das Nações Unidas e os regulamentos internacionais e europeus. Paralelamente, passei a mensagem de que, graças aos meus laços estreitos com os cipriotas turcos, posso promover uma solução para o problema turco. EN: Deve, em, parte, a sua eleição aos votos de certos militantes do partido DIKO, o partido do presidente deposto Papadopoulos. Isso não vai limitar os seus objectivos de uma paz duradoura? DC: De maneira nenhuma. Temos um programa e esse programa é conhecido dos militantes do partido democrático, DIKO, e do partido socialista ADEK. Ambos decidiram apoiar-me na segunda volta. Ninguém pode dizer que o nosso programa trai os direitos do povo. EN: A independência do Kosovo foi reconhecida por vários Estados, incluindo países da União Europeia e os Estados Unidos. O que é que esta decisão pode implicar, no que diz respeiro à resolução do problema cipriota? DC: Penso que, na base do tratado final de Helsínquia, e também das leis internacionais, os Estados devem salvaguardar a integridade territorial. Isso vale também para a Sérvia. Mas não tem nenhuma ligação com Chipre. Nós fomos vítimas de uma invasão, de uma ocupação. Fomos vítimas da violação da nossa integridade territorial e da soberania democrática de Chipre. Mas parece que alguns responsáveis, na comunidade cipriota turca e mesmo na Turquia aceitam a ideia de que estas duas situações são a mesma coisa. EN: Muitas coisas foram ditas e escritas sobre o facto de o senhor ser comunista. Pensa que isso vai complicar as relações de Chipre com os outros Estados-membros da União Europeia, em particular aqueles para têm uma certa repulsa pelo próprio termo "comunismo"? DC: Não é esta a altura de analisar o que quer dizer "comunista" e o como é que Demetris Christofias pensa que a justiça social deve ser aplicada. Mas, uma vez que me pergunta, a justiça social está no coração do comunismo. O povo cipriota é soberano e tem o direito de escolher o seu destino. Eles acreditam em Demetris Christofias como alguém que se bate pela justiça social e pela reunificação do país, sem o compararem a nenhum líder do passado ou do sistema que existiu na Europa de Leste. EN: Nos estatutos, o seu partido AKEL demonstra uma crença no marxismo-leninismo. Que lugar pode ter esta ideologia num país moderno, avançado e com impostos baixos, como é o caso de Chipre? DC: O nosso movimento político é um factor estabilizador para ajudar o crescimento da nossa economia e do nosso Estado, sempre com uma dimensão social. É essa a diferença. Aplicamos o marxismo, se puder exprimir-me assim, de uma maneira criativa. Não somos dogmáticos. Quero realçar que, por exemplo, no nosso partido o ateísmo não é uma característica dominante. 95% dos nossos militantes e da nossa equipa dirigente são pessoas que têm uma crença religiosa.

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